Sem qualquer vergonha ou escrúpulo, a Câmara dos Deputados aprovou em dois turnos de votação, nesta terça-feira (16), a PEC das Prerrogativas. Também chamada de “PEC da Blindagem”, talvez a melhor definição seja “PEC da Bandidagem”. Na prática, o texto altera a Constituição Federal do país para garantir a impunidade a parlamentares e dirigentes partidários.
O texto aprovado impede que deputados e senadores (e também líderes de partidos) sejam processados criminalmente pelo STF (Supremo Tribunal Federal) sem autorização prévia da respectiva Casa Legislativa, que terá até 90 dias para decidir se permite ou não a abertura da ação penal. Faz ainda outras alterações que dificultam o indiciamento de parlamentares.
A PEC foi aprovada por uma ampla maioria. No 1° turno, o texto obteve 353 votos a favor, 134 contrários e uma abstenção, superando com folga o mínimo necessário de 308 votos. Duas horas depois, já por volta das 23h30, a proposta foi novamente aprovada em segundo turno, com 344 votos favoráveis e 133 contrários. Para acelerar a tramitação, os deputados aprovaram a dispensa de sessões entre os turnos, o chamado interstício, e a votação seguiu até a madrugada desta quarta-feira (17).
O que muda com a PEC
O texto aprovado impede que deputados e senadores sejam processados criminalmente sem autorização prévia da respectiva Casa Legislativa. Mesmo em casos de flagrante por crimes inafiançáveis — como homicídio ou estupro — a prisão dependerá de confirmação pelo plenário em até 24 horas. A votação será secreta.
Já a votação de abertura de processo criminal também exigirá a autorização dos parlamentares e também terá votação secreta. Ontem à noite, por falta de quórum, a votação secreta chegou a ser derrubada, mas hoje, uma manobra de Hugo Motta e da extrema direita, retomou a votação sigilosa. Ponto de honra para os parlamentares, afinal, sequer têm a coragem de colocar a digital na hora de impedirem processos contra eles próprios.
A PEC ainda estende o foro privilegiado do STF para presidentes nacionais de partidos com representação no Congresso. Ou seja, dirigentes partidários que muitas vezes estão diretamente envolvidos na distribuição de verbas, em esquemas de emendas e na articulação política passam a ter um escudo jurídico especial.
Outro ponto escandaloso é que, caso a Casa Legislativa decida barrar o processo, a contagem da prescrição do crime fica suspensa durante todo o mandato, funcionando como uma blindagem extra contra responsabilização.
Um projeto de impunidade
O presidente da Câmara Hugo Motta (Republicanos-PB) e defensores da medida afirmam que se trata apenas de restabelecer “prerrogativas constitucionais” e proteger os parlamentares de “perseguições políticas”. Um escárnio com a população.
A movimentação de deputados e senadores para aprovação desta PEC ocorre no rastro da recente condenação de Bolsonaro no STF por tentativa de golpe de Estado e diante do avanço de processos contra parlamentares golpistas e envolvidos em escândalos de corrupção ligados às emendas parlamentares.
Na prática, essa PEC significa que deputados e senadores julgarão a si próprios, criando um mecanismo institucional de autoproteção. O histórico de votações do tipo nas Casas revela o corporativismo e a impunidade reinantes. Segundo levantamento do G1, o Congresso negou mais de 250 pedidos de abertura de processo criminal apresentados pelo STF e autorizou apenas um processo contra parlamentar entre 1988 e 2001, período em que estava em vigor regra semelhante à nova PEC.
Exemplos recentes, como o caso da deputada Carla Zambelli, condenada e presa na Itália após fugir do país, e do deputado Eduardo Bolsonaro, nos EUA desde o início do ano para articular junto ao governo Trump sanções e ataques ao Brasil, também indicam o tipo de comportamento deste Congresso com crimes e irregularidades de seus pares.
Em ambos os casos, a Câmara não julgou o afastamento dos parlamentares. Ao contrário, Zambelli conta com uma manobra para ganhar tempo, que remeteu o caso para a CCJ (Comissão de Constituição e Justiça) e, Eduardo Bolsonaro, foi definido pelo PL como líder da minoria, numa tentativa de evitar sua cassação por ausências injustificadas.
Não à PEC da Bandidagem! Sem anistia!
A PEC da Bandidagem segue agora para o Senado, onde também terá de ser aprovada em dois turnos.
Ao mesmo tempo, bolsonaristas e deputados do Centrão tentam votar ainda nesta quarta-feira (17) o regime de urgência para a PEC da Anistia aos golpistas envolvidos nos atentados do 8 de janeiro de 2023 e na tentativa de golpe de Estado.
Mais uma vez fica demonstrado: somente a mobilização da classe trabalhadora e setores populares pode dar um basta aos desmandos do Congresso, dos governos e patrões, que querem impunidade para seus crimes, buscam aumentar seus privilégios e atentam contra as liberdades democráticas, enquanto para a população impõem redução de direitos trabalhistas e previdenciários, privatizações, reformas neoliberais para destruir os serviços públicos, entre outros ataques.
Não à PEC da Bandidagem! Sem anistia para golpistas! Cassação de Eduardo Bolsonaro e Carla Zambelli, já!