No fim do mês passado, um caso de desespero envolvendo uma vítima de violência doméstica teve grande repercussão em todo país. Uma moradora de Andradina, no interior de São Paulo, telefonou de madrugada para o 190, número de emergência da Polícia Militar, fingindo pedir uma pizza. Quando recebeu a ligação, o soldado de plantão estranhou o pedido e informou que ela estava ligando para o serviço de emergência da PM. Ao responder que sabia, o policial entendeu o recado e solicitou o envio de uma viatura para atendê-la no local.
Já no início deste mês, outra notícia sobre violência doméstica ganhou grande repercussão nacional, só que desta vez pela brutalidade do caso que era uma tragédia anunciada. Fernanda Landin, 33, foi morta pelo companheiro mesmo já tendo o denunciado por violência seis vezes.
A necessidade de manter o isolamento social para conter a disseminação da Covid-19 fez com que muitas mulheres passassem a estar cada vez mais presas a seus agressores. O fato de estarem distantes da família, amigos, vizinhos e 24 horas por dia na presença dos companheiros tanto contribui para o aumento dos episódios de agressão quanto dificulta a possibilidade de denunciar.
Em 2020, segundo o Ministério da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos, foram registradas 105.821 denúncias de violência contra a mulher nas plataformas do Ligue 180 e do Disque 100. Isso equivale a uma denúncia de violência contra mulher a cada 5 minutos. O governo informou ainda que a maioria das denúncias tem como vítimas mulheres declaradas como de cor parda de 35 a 39 anos. Já em relação aos suspeitos, o perfil mais comum é de homens brancos com idade entre 35 e 39 anos.
Segundo a pesquisa ‘Violência doméstica contra a mulher na pandemia’, divulgada em novembro de 2020 pelo Locomotiva e Instituto Patrícia Galvão, dentre os possíveis motivos apontados pelos entrevistados para o aumento da violência doméstica estão: aumento no consumo de álcool, estresse/irritação por causa do isolamento, pessoas convivendo por mais tempo dentro de casa, preocupação com a falta de dinheiro, mulheres e homens estarem tendo contato por mais tempo e a sobrecarga da mulher pela falta de divisão do trabalho.
No entanto, a mesma pesquisa também mostra que, para 95% das pessoas consultadas, homens que agridem mulheres no isolamento social já faziam isso antes da pandemia. Ou seja, nenhum dos possíveis motivos apontados de fato justifica esse aumento. A violência de gênero sempre foi enraizada e legitimada pela sociedade patriarcal em que vivemos. A pandemia, infelizmente, só evidenciou esse fato e criou um ambiente mais favorável para esse tipo de violência.
Em março deste ano, o governo, em parceria com o Conselho Nacional de Justiça (CNJ), lançou uma campanha de combate à violência contra a mulher em todo o país. Além disso, o governo federal oferece os seguintes canais de denúncia: Disque 100, ligue 180, mensagem pelo WhatsApp no número (61) 99656-5008, telegram, no canal "Direitoshumanosbrasilbot", site da Ouvidoria do Ministério e o aplicativo "Direitos Humanos Brasil" (para iOS e Android).
Mas, ainda é pouco. Quando o assunto é violência de gênero são necessárias medidas emergenciais contundentes para que uma melhora do quadro seja de fato sentida. Cabe destacar, inclusive, que não adianta o governo federal lançar campanhas de combate à violência quando o próprio presidente da república Jair Bolsonaro (Sem Partido) faz, com frequência, declarações violentas e misóginas. É urgente uma mudança de pensamento coletivo. É necessária a criação de políticas públicas educacionais de combate ao machismo, mais investimento na lei Maria da Penha e novas leis de proteção às vítimas, bem como a ampliação de delegacias especializadas e funcionamento nos finais de semana. Rondas com foco em atender esse tipo de ocorrência. Além disso, é urgente que as medidas protetivas tenham mais rigidez.
Mas, para ser consequente na luta contra o machismo e a opressão é preciso lutar também contra o capitalismo, pois é esse sistema que gera a desigualdade e a opressão. E para isso, não basta ser mulher, nem “empoderada”, é preciso ser trabalhadora e defender também os interesses das mulheres trabalhadoras, como: creche, salário igual para trabalho igual, fim da dupla jornada e que esses direitos não fiquem só no papel. Só a derrota do capitalismo pela classe trabalhadora pode assegurar o fim da exploração e as condições para o fim do machismo e de toda opressão. Por isso precisamos nos organizar como classe trabalhadora, com as mulheres à frente, para lutar contra o machismo e a violência, combatendo todos os preconceitos e ideologias que inferiorizam a mulher, mas também para derrotar esse sistema burguês capitalista que nos oprime e nos explora.
Autor: Francisca Pires