Na última quarta-feira (17), foi publicada a sentença referente ao processo movido pelo Ministério Público Estadual contra o Estado do Rio Grande do Norte, em virtude da falta de condições de funcionamento do prédio que funciona como sede da Secretaria Estadual de Saúde Pública (Sesap). O processo tramita na Justiça do Trabalho e o Sindsaúde entrou como assistente no processo, se somando ao pedido do Ministério Público para que fosse garantida a segurança dos servidores do prédio.
O processo foi julgado pelo Juiz Titular da 2ª Vara do Trabalho de Natal, Luciano Athayde, que condena o Estado a pagar indenização de R$ 2 milhões por danos morais coletivos, reversível aos próprios hospitais públicos da rede estadual de saúde. Além disso, o juiz determinou uma multa no valor de R$ 750 mil, caso o governo não execute em 90 dias a reforma do prédio, com medidas como mudança de elevadores e reforma elétrica.
Riscos diários
Após incêndio ocorrido no prédio, foi instalado um procedimento investigatório pelo Ministério Público, tendo sido constatado a precariedade das instalações elétricas da Sesap, além de falhas relacionadas à prevenção e combate a incêndio.
Os servidores que trabalham no edifício enfrentam riscos diariamente. Além de sérios prejuízos ao bem-estar, os trabalhadores continuam convivendo com riscos de incêndio, sem condições adequadas necessárias. As saídas de emergência do prédio de treze andares são praticamente inexistentes.
Os princípios de incêndio são comuns. O último ocorreu no final de 2013, mas não chegou a ser noticiado. Em 2012, as chamas puderam ser vistas pela janelas do prédio. Em abril de 2015, houve dois casos de vazamento de gás em um intervalo entre duas semanas, causado por uma válvula de um botijão instalado na cozinha do 6º andar do edifício. Além disso, em outubro do ano passado, houve um vazamento de água, onde comprometeu o funcionamento dos elevadores.
“Os servidores não podem estar expostos a esses riscos, essa situação está acontecendo há muito tempo, não é de agora. Os problemas estruturais são muitos, sempre reivindicamos a interdição do prédio, mas nunca foi feita. Achamos que até que seja realizada a reforma, o prédio deve ser interditado, pois são as vidas de vários trabalhadores que estão em jogo”, disse Manoel Egídio Jr, coordenador-geral do Sindsaúde-RN.
Confira a sentença na integra:
Processo nº 0001049-75.2014.5.21.0002 - 2ª. Vara do Trabalho de Natal/RN
AÇÃO CIVIL PÚBLICA
Autor: MINISTÉRIO PÚBLICO DO TRABALHO (PROCURADORIA REGIONAL DO TRABALHO DA 21ª. REGIÃO)
Rés: ESTADO DO RIO GRANDE DO NORTE
S E N T E N Ç A
Trata-se de ação civil pública, proposta pelo MINISTÉRIO PÚBLICO DO TRABALHO (PROCURADORIA REGIONAL DO TRABALHO DA 21ª. REGIÃO) em face do ESTADO DO RIO GRANDE DO NORTE (SECRETARIA DE ESTADO DE SAÚDE PÚBLIA - SESAP), devidamente qualificadas na petição inicial.
Alega a parte autora que, após incêndio ocorrido no prédio onde funciona a Secretaria de Estado de Saúde Pública (SESAP), instalou procedimento investigatório, tendo sido constatada a precariedade das instalações elétricas da SESAP, além de falhas relacionadas à prevenção e combate a incêndio no referido prédio.
Aponta, ainda, a existência de graves falhas na estrutura do prédio, gerando risco iminente de acidentes, além de outras irregularidades verificadas no meio ambiente do trabalho capazes de causar danos à saúde dos trabalhadores que ali atuam.
Relata que, mesmo após ter recebido os relatórios técnicos e ter sido notificado pelo parquetacerca dos problemas verificados e das providências a serem adotadas, o Estado do Rio Grande do Norte se quedou inerte, tendo o secretário do Estado, titular da SESAP, recusando-se a assinar termo de ajustamento de conduta proposto pelo MPT, ora autor.
Após detalhar as circunstâncias fáticas e jurídicas que embasam a pretensão, deduziu pedido de tutela de urgência e, no mérito, requereu prestação jurisdicional para determinar ao Réu o cumprimento, de forma progressiva, das obrigações elencadas na parte final da petição inicial, sob pena de interdição do prédio da SESAP, além de cominação de multa diária de R$ 100.000,00. Postula, ainda, a condenação do Réu ao pagamento de indenização por danos morais coletivos, no montante de R$ 20.000.000,00, reversível aos próprios hospitais públicos da rede estadual de saúde.
Proferida decisão interlocutória, assentando a competência material deste Juízo para conhecer e processar o feito, bem como deferindo, em parte, o pedido de tutela de urgência, em ordem a determinar a expedição de mandado para que o Estado do Rio Grande do Norte, no prazo de 30 dias, apresentasse em Juízo um plano de atendimento das obrigações relacionadas nos itens 109, I, II, III e IV da petição inicial (ID bfa7ea5a9 - pp. 59 e ss.), sob pena de: a) fixação de multa diária de R$ 50.000,00, em caso de atraso no cumprimento da presente ordem judicial, que será apurada até o período de 15 dias de inércia do réu; b) interdição do prédio da SESAP - Secretaria de Saúde do Estado do Rio Grande do Norte, situado na Av. Marechal Deodoro da Fonseca, n. 730, Cidade Alta, Natal/RN; e sem prejuízo da cominação de outras medidas necessárias à efetivação desta tutela (cf.: art. 461,§§ 4º e 5º do CPC, de aplicação supletiva), caso persista a inércia em período superior a 15 dias.
Apresentada manifestação do Réu, informando que já iniciou processo administrativo relativo à reforma do prédio onde funciona a SESAP, apontando, todavia, a existência de entraves de ordem orçamentária (ID ab90c75).
O MPT manifestou-se acerca dos documentos apresentados pelo Estado do Rio Grande do Norte (ID b1b1a55).
O Sindicato dos Servidores em Saúde do Estado do Rio Grande do Norte apresentou pedido de habilitação como assistente simples no pólo ativo da presente demanda (ID 8f8282b).
Admitida, por este Juízo, a intervenção do Sindicato dos Servidores em Saúde do Rio Grande do Norte, na qualidade de assistente simples.
Contestação apresentada pelo Réu, suscitando preliminar de carência da ação. No mérito, admite a necessidade de aquisição de mobiliário e reforma do edifício-sede da SESAP, porém pontua a existência de formalidades legais a serem cumpridas para a sua realização. Nega que tenha se quedado inerte durante todo o período desde a concessão da tutela antecipada por este Juízo. Alerta, ainda, sobre a carência de recursos financeiros da Administração Pública estadual, bem como sobre a necessidade de se observar as normas orçamentárias vigentes. Nega, ainda, a existência de dano moral coletivo no caso concreto. Pugna, finalmente, pela improcedência da ação (ID e7462d4).
Em audiência, a conciliação das partes não foi alcançada, tendo sido concedido prazo para a apresentação de documentos pelo Réu (ID 4fdf155).
O Estado do Rio Grande do Norte apresentou documentação, ID 44994b2.
O MPT se manifestou acerca da documentação apresentada, ID b1b1a55.
Encerrada a instrução processual.
Razões finais apresentadas em memoriais pelo MPT (ID dfd8fa5).
Não houve êxito na conciliação.
É o relatório.
I. Fundamentos da Decisão
1. Preliminarmente
1.1. Da competência da Justiça do Trabalho
Consoante já assentado na decisão interlocutória de ID 0ca74b8, esta Justiça Especializada da União é competente para conhecer e processar o presente feito, nos termos do art. 114, I, da Constituição Federal, bem como diante da interpretação sumulada pelo excelso Supremo no verbete n. 736: "Compete à Justiça do Trabalho julgar as ações que tenham como causa de pedir o descumprimento de normas trabalhistas relativas à segurança, higiene e saúde dos trabalhadores".
E não se diga que esse preceito não se aplica a órgãos da Administração Pública, já que esse tema já se encontra estabilizado também pelo Supremo Tribunal Federal, como espelha o seguinte aresto:
"AGRAVO REGIMENTAL. RECLAMAÇÃO. AFRONTA AO DECIDIDO NA ADI 3.395-MC/DF. NÃO OCORRÊNCIA. AÇÃO CIVIL PÚBLICA PROPOSTA NA JUSTIÇA DO TRABALHO, PARA IMPOR AO PODER PÚBLICO A OBSERVÂNCIA DAS NORMAS DE SAÚDE, HIGIENE E SEGURANÇA DO TRABALHO NO ÂMBITO DE HOSPITAL. AUSÊNCIA DE SIMILITUDE ENTRE O ATO RECLAMADO E A DECISÃO PARADIGMA. AGRAVO IMPROVIDO. I - Esta Corte, por ocasião do julgamento da ADI 3.395-MC/DF, deu interpretação conforme ao art. 114, I, da Constituição Federal, para excluir da competência da Justiça do Trabalho as causas instauradas entre o Poder Público e servidor que lhe esteja vinculado por relação jurídico-estatutária. II - O ato reclamado deve ajustar-se com exatidão ao paradigma invocado, a fim de que se verifique afronta à autoridade de decisão deste Tribunal. III - A ausência de similitude entre o ato reclamado e o acórdão indicado como paradigma impede o julgamento da reclamação. IV - No caso, trata-se de Ação Civil Pública proposta pelo Ministério Público do Trabalho, com o fim de apurar o descumprimento de normas relativas ao meio ambiente do trabalho, especialmente no que se refere ao Hospital 28 de Agosto, localizado em Manaus/AM, o que afasta a competência da Justiça comum. V - Agravo improvido (STF - Agravo na Reclamação 13.113-AM, Rel. Min. Ricardo Lewandovsky, 18.12.2013) (grifos acrescidos)".
Em caso similar, também já se posicionou o Tribunal Superior do Trabalho:
AGRAVO DE INSTRUMENTO EM RECURSO DE REVISTA. COMPETÊNCIA DA JUSTIÇA DO TRABALHO. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. DEFESA DO MEIO AMBIENTE DO TRABALHO. ENTE PÚBLICO. NATUREZA CELETISTA OU ESTATUTÁRIA DA RELAÇÃO JURÍDICA. IRRELEVÂNCIA. 1. Trata-se de ação civil pública pela qual se busca "a interdição do edifício sede da Procuradoria Geral do Estado", "no qual laboram, além de servidores estatutários, ' dezenas de trabalhadores terceirizados, regidos pela CLT, os quais também se encontram diuturnamente expostos aos graves e iminentes riscos verificados nas dependências daquela edificação'". A demanda "visa à preservação da saúde e a segurança da coletividade dos trabalhadores que prestam serviço na edificação, sejam eles inseridos numa relação contratual trabalhista ou estatutária, bem como toda a sociedade que transita por aquele ambiente". Diante do quadro, o e. TRT concluiu que "A natureza do vínculo existente entre as partes, se estatutária ou celetista, não tem o condão de afastar a competência da Justiça do Trabalho, na medida em que a preservação do meio ambiente de trabalho afigura-se como um direito social (art. 7º, XXII, da Constituição Federal), e nessa condição, direito de todo e qualquer trabalhador". Acrescentou que "o ambiente laboral em causa põe em risco não apenas os ocupantes de cargos públicos, mas todos os trabalhadores que ali prestam serviços - aí incluídos os terceirizados, cuja relação é estritamente celetista. Isto já seria suficiente para atrair a competência da Justiça do Trabalho". 2. Não há justificativa jurídica ou faticamente plausível para cindir o meio ambiente em setores - celetista e estatutário. O ambiente de trabalho é um só e as diretrizes elementares e imperativas de segurança, saúde e higiene do trabalho aplicam-se a todos aqueles que laboram no recinto público, não guardando relevância a qualificação do vínculo jurídico que possuam com o ente público tomador dos serviços. O que se tutela na presente demanda é a higidez do local de trabalho e não o indivíduo trabalhador em si - e esta é a razão pela qual a qualificação ao vínculo jurídico que ostenta é irrelevante. 3. Dessarte, não há como conferir outra solução à lide, que não a de considerar a Justiça do Trabalho competente para as ações alusivas ao meio ambiente do trabalho. Inteligência da Súmula 736 do STF. Precedentes. Intacto o art. 114, I, da Constituição Federal. 4. Divergência jurisprudencial formalmente válida não demonstrada (art. 896, a, da CLT).[...] (TST - AIRR: 1285007020135130025, Relator: Hugo Carlos Scheuermann, Data de Julgamento: 12/08/2015, 1ª Turma, Data de Publicação: DEJT 18/08/2015)
Com efeito, a presente ação visa tutelar o próprio meio ambiente laboraldaqueles que prestam serviços no prédio da SESAP, aí incluídos os trabalhadores terceirizados regidos pela CLT e também os servidores estatutários do Estado ali lotados, e não direitos individuais decorrentes do vínculo laboral mantidos com seus empregadores.
Desse modo, reafirmo a competência da Justiça Laboral para apreciar a presente demanda, com arrimo no art. 114, inciso I, da Constituição Federal.
1.2. Da carência da ação
Suscita o Réu a carência da ação por estar ausente o interesse de agir do Ministério Público do Trabalho, sob o argumento de que as medidas postuladas no âmbito da presente demanda já estão sendo providenciadas administrativamente pelo Estado do Rio Grande do Norte, que já teria dado início a processo administrativo destinado à reforma do prédio-sede da SESAP.
Defende que, inexistindo resistência do Poder Público Estadual em cumprir as obrigações que são objeto da presente ação, reponta inócua a prestação jurisdicional perseguida e, portanto, ausente o interesse de agir.
Sem razão.
Assinalo, na linha dos fundamentos da moderna teoria geral do processo, que as condições da ação são verificadas no plano abstrato (in statu assertionis), a partir da dedução feita em Juízo pelo requerente da tutela jurisdicional (res in iudictio deducta).
Por isso, a literatura e a jurisprudência trabalhista vêm insistindo para que se observe a melhor técnica quando se trata de alegação de inexistência de liame empregatício:
Deve-se compreender, de uma vez para sempre, que a circunstância de o órgão jurisdicional não admitir a existência da relação de emprego entre as partes não significa que o réu seja parte ilegítima ad causam, na medida em que somente ele estava legalmente apto para resistir às pretensões do autor, ou com elas concordar, em decorrência da relação de fato (material) havida ou ainda existente entre ambos (TEIXEIRA FILHO, Manoel Antonio, A sentença no processo do trabalho. São Paulo: LTr, 1994, p. 173).
RECURSO DE REVISTA. CARÊNCIA DE AÇÃO. ILEGITIMIDADE DE PARTE - IMPOSSIBILIDADE JURÍDICA DO PEDIDO. A legitimidade para a causa, segundo a teoria da asserção adotada pelo ordenamento jurídico brasileiro para a verificação das condições da ação, é aferida conforme as afirmações feitas pelo reclamante na inicial. Assim, resulta patente a legitimidade ativa e passiva ad causam. Por outro lado, a impossibilidade jurídica somente se configura quando há vedação do ordenamento jurídico ao pedido formulado, o que não se constata no presente processo. Assim, o pedido é juridicamente possível. Recurso de revista não conhecido (RR-391800-89.2006.5.02.0084, Rel. Min. Dora Maria da Costa, Data de Julgamento: 11/10/2011, 8ª Turma, Data de Publicação: 14/10/2011).
RECURSO DE REVISTA. CARÊNCIA DA AÇÃO. ILEGITIMIDADE DE PARTE. A aferição da legitimidade das partes se dá à luz da teoria da asserção, independentemente de prova quanto à titularidade do reclamante em relação aos direitos vindicados e à responsabilidade da reclamada quanto ao adimplemento das correspondentes obrigações, o que inviabiliza a invocada violação dos dispositivos (RR-176700-47.2001.5.02.0442, Rel. Min. Rosa Maria Weber, Data de Julgamento: 04/08/2010, 3ª Turma, Data de Publicação: 20/08/2010).
Quanto ao interesse de agir, registro que é direito fundamental, previsto na Constituição da República, de qualquer cidadão ou entidade dotada de personalidade o livre acesso ao Poder Judiciário (art. 5º, inciso XXXV).
No caso em tela, o Estado do Rio Grande do Norte alega não ter manifestado qualquer resistência à pretensão formulada pelo Ministério Público do Trabalho, tanto que estaria adotando medidas administrativas para a adequação do prédio onde funciona a SESAP.
Todavia, tem-se que a análise acerca do cumprimento espontâneo das obrigações sobre as quais versam a presente demanda pelo Réu é matéria de mérito, e como tal será analisada.
Rejeito, pois, a preliminar referente à carência da ação.
1.3. Da (ir)regularidade da citação. Do rito processual adotado
Aduz o Estado do Rio Grande do Norte não ter havido sua citação regular, tendo em vista que não lhe foi conferido o prazo de 60 dias para a apresentação da defesa, assegurado art. 19 da Lei Federal 7.347/85 e arts. 188 e 297 do CPC.
Assevera que a Lei 7.347/85 prevê rito especial para a Ação Civil Pública e a aplicação subsidiária das normas do CPC, ao invés da legislação trabalhista vigente.
Requer, assim, a aplicação do rito próprio da Ação Civil Pública ao caso concreto e, em consequência, a fixação de prazo formal para a resposta (contestação), sob pena de se violar o devido processo legal.
Neste particular, anoto que, embora não haja dúvida acerca da possibilidade de ajuizamento de Ação Civil Pública na Justiça do Trabalho atualmente, há de se observar quer, inicialmente, a Lei n. 7.347/85 (LACP) não se aplicava ao processo trabalhista, já que foi vetado o inciso IV, de seu art. 1º, que previa o seu cabimento para a tutela de outros interesses difusos e coletivos que não os expressamente elencados pela norma, de modo a tornar exaustivo o rol dos interesses tuteláveis pela ação civil pública.
Contudo, a Constituição Federal de 1988 ampliou o objeto da ação civil pública para alcançar outros interesses difusos e coletivos (art. 129, III) e, posteriormente, a Lei 8.038/90 (Código de Defesa do Consumidor), restabeleceu o inciso IV da LACP.
Nesse contexto, penso que a utilização da ACP na seara trabalhista, a partir da ampliação das suas hipóteses de cabimento, deve ser acompanhada de uma adaptação do seu rito às normas inerentes ao processo do trabalho, tendo em vista que o processo comum será fonte subsidiária do direito processual do trabalho somente quando houver omissão deste.
Nesse sentir, na ação civil pública trabalhista, em caso de omissão da LACP e do CDC (cuja parte processual é aplicável à disciplina da ação civil pública por força dos arts. 21, da Lei 7.347/85 e 90, da Lei 8.078/90), deve o intérprete socorrer-se das normas processuais constantes da CLT e, só na omissão desta, recorrerá ao Código de Processo Civil.
No mesmo sentido, Raimundo Simão de Melo, ao comentar o rito processual a ser adotado na Ação Civil Pública trabalhista, afirma:
"À Ação Civil Pública e às demais ações coletivas na Justiça do Trabalho não é possível adotar apenas o procedimento da CLT - Consolidação das Leis do Trabalho -, porque essa é insuficiente e incompatível com o sistema de jurisdição coletiva. Não cuida a CLT, por exemplo, de importantes questões que diferenciam o sistema de jurisdição coletiva, como a legitimação ativa, a litispendência, o sistema da coisa julgada, entre outras importantes questões. Assim, há de se aplicar subsidiariamente à CLT o plexo da jurisdição coletiva formado pela LACP (Lei n. 7.347/85) e o pelo CDC (Lei 8.078/90) e, subsidiariamente, o Código de Processo Civil, este apenas nas hipóteses de omissão e desde que haja compatibilidade com os interesses defendidos (CLT, art, 769, e LACP, art. 21)". (In Ação Civil Pública na Justiça do Trabalho. 5. ed. São Paulo: LTr, 2014. p. 255)
Em sendo assim, não dispondo a LACP acerca do momento para a oferta da defesa, há de se utilizar, na Ação Civil Pública Trabalhista, as regras previstas para o processo laboral, isto é, por ocasião da audiência inaugural.
De se destacar, ademais, que, na espécie, restou respeitada a prerrogativa prevista no Decreto-Lei 779/69, aplicado aos entes de direito público interno, que dispõe, em seu art. 1º, inciso II, que o prazo previsto no art. 841, in fine, da CLT, deve ser observado em quádruplo.
Não vislumbro, pois, qualquer irregularidade no rito processual adotado no presente feito, não exsurgindo devida a abertura de novo prazo para a apresentação de defesa pelo Estado do Rio Grande do Norte.
2. Mérito
2.1. Do inadequado ambiente de trabalho dos trabalhadores lotados no edifício-sede da Secretaria de Estado de Saúde Pública - SESAP. Da situação de risco iminente. Da inércia da Administração Pública ante à violação de direitos fundamentais dos trabalhadores.
A presente Ação Civil Público visa o cumprimento, pelo Estado do Rio Grande do Norte, de providências necessárias à adequação do meio ambiente laboral dos trabalhadores lotados no edifício-sede da Secretaria de Estado de Saúde Pública - SESAP, tendo em vista a existência de problemas que estariam colocando em risco a vida daqueles aqui ali laboram, além dos cidadãos que necessitam ir àquele órgão estadual.
Aduz que, após incêndio ocorrido no referido prédio, instalou procedimento investigatório, tendo sido constatada que a precariedade das instalações elétricas da SESAP, além de falhas relacionadas à prevenção e combate a incêndio no referido prédio.
Aponta, ainda, a existência de graves falhas na estrutura do prédio, gerando risco iminente de acidentes, além de outras irregularidades verificadas no meio ambiente do trabalho capazes de causar danos à saúde dos trabalhadores.
Relata que, mesmo após ter recebido os relatórios técnicos e ter sido notificado pelo parquetacerca dos problemas verificados e das providências a serem adotadas, o Estado do Rio Grande do Norte se quedou inerte, tendo o titular da SESAP se recusado a assinar o termo de ajustamento de conduta proposto pelo autor.
Na peça de defesa, o Estado do Rio Grande do Norte admite a necessidade de aquisição de mobiliário e reforma do edifício-sede da SESAP, porém pontua a existência de formalidades legais a serem cumpridas para a sua realização. Alerta sobre a carência de recursos financeiros da Administração Pública estadual, bem como sobre a necessidade de se observar as normas orçamentárias vigentes. Afirma, ademais, já ter dado início a processo administrativo destinado à reforma do prédio e à adoção de medidas necessárias à adequação das condições de trabalho às exigências legais.
Em sede de antecipação de tutela, proferi a seguinte decisão com os seguintes fundamentos:
"No presente caso, há laudos e documentos que indicam que a saúde e a segurança dos trabalhadores que prestam serviços na SESAP estão gravemente ameaçadas pelas condições estruturais e ambientais da edificação. Transborda até mesmo os limites do juízo de delibação o potencial de persuasão dos elementos carreados aos autos pelo MPT, os quais, em grande medida, constituíram a instrução do procedimento investigatório.
A diversidade dos problemas e o risco que eles projetam sobre o contingente de trabalhadores justificam a urgência da medida.
Nessas condições, e nos termos dos arts. 11 e 12 da Lei Federal n. 7.247/85 (LACP), defiro, em parte, o pedido de tutela de urgência, em ordem a determinar a expedição de mandado para que o ESTADO DO RIO GRANDE DO NORTE, no prazo de 30 dias, apresente a este Juízo um plano de atendimento das obrigações relacionadas nos itens 109, I, II, III e IV da petição inicial (ID bfa7ea5a9 -
pp. 59 e ss.), sob pena de:
a) fixação de multa diária de R$ 50.000,00, em caso de atraso no cumprimento da presente ordem judicial, que será apurada até o período de 15 dias de inércia do réu;
b) interdição do prédio da SESAP - Secretaria de Saúde do Estado do Rio Grande do Norte, situado na Av. Marechal Deodoro da Fonseca, n. 730, Cidade Alta, Natal/RN; e sem prejuízo da cominação de outras medidas necessárias à efetivação desta tutela (cf.: art. 461,§§ 4º e 5º do CPC, de aplicação supletiva), caso persista a inércia em período superior a 15 dias.
Expeça-se mandado de intimação contra o ESTADO DO RIO GRANDE DO NORTE, distribuindo-se, com urgência, ao Oficial de Justiça de Plantão.
Dê-se ciência ao Ministério Público do Trabalho, por meio do PJe-JT.
Cumpra-se."
Com efeito, a documentação acostada aos autos revela a gravidade dos problemas de ordem estrutural e ambiental da sede da SESAP e o elevado risco a que estão expostas as pessoas que ali desenvolvem suas atividades laborativas.
O Relatório Técnico, registrado sob ID d2f8437, discrimina diversas irregularidades verificadas no imóvel, indicadas adiante:
1. Condições Estruturais:
a) Comprometimento acentuado das partes de concreto com exposição e oxidação excessiva de suas estruturas armadas (ferragens), bem como desprendimento de partes destas estruturas, gerando riscos de acidentes aos usuários, servidores e pedestres que porventura venham a transitar nas proximidades e calçadas do prédio;
b) Desgaste acentuado do revestimento externo, pintura e outros itens da alvenaria, com risco de quedas de partes de alvenaria em razão de seu desgaste;
c) janelas com vidros quebrados/trincados em todos os andares do prédio (exceto subsolo e 2º andar). Em alguns andares foi encontrada a ausência destes vidros, que foram substituídos por objetos totalmente inadequados, tais como papelão, filtros de luzes (tampa de proteção de luz), etc.;
d) inexistência, em grande parte das salas, de "insulfilm" de proteção, persianas ou outro instrumento que atenuasse o excesso de luminosidade e radiação solar, gerando grande desconforto e influenciando diretamente na climatização do ambiente;
e) os pisos dos andares dos prédios, com exceção do térreo, 2º e 12º andares, e grande parte dos corredores, encontram-se com saliências ou depressões que prejudicam a circulação e o processo de trabalho, provocando, em alguns casos, acidentes de trabalho;
f) as tomadas de energia existentes no piso que não possuem proteção (algumas desativadas), ficando as mesmas expostas à entrada de água ou objetos estranhos, sendo mais um fator favorável às ocorrências de acidentes de trabalho;
g) ocorrência de buracos e/ou rachaduras nas paredes dos seguintes andares: subsolo, 1º, 5º, 6º e 12º andares;
h) umidade excessiva em todos os andares, principalmente na parte frontal (fachada). Alguns pontos foram considerados como críticos, como, por exemplo, no subsolo, onde se observou a formação de grande quantidade de fungos (mofo), comprometendo de forma significativa a saúde e segurança dos trabalhadores que venham a transitar por aquele ambiente.
2. Condições elétricas:
a) grande quantidade de fiação exposta, principalmente em decorrência da má organização dos setores e equipamentos de informática;
b) sobrecarga do sistema elétrico em consequência do acréscimo de equipamentos nos setores e a defasada estrutura do sistema elétrico, gerando grande risco aos usuários, principalmente riscos de incêndio e explosão;
c) presença de tubulação fluvial (água de chuva) passando por sobre os equipamentos energizados da subestação, localizados no subsolo (substação), configurando-se uma condição de risco grave e iminente a todos os usuários;
d) caixas de força sem tampa para o isolamento e, quando existentes, essas tampas eram adaptadas em madeira, sem isolamento adequado e sinalização. Em diversos andares do prédio, estes equipamentos encontravam-se obstruídos e com grande acúmulo de sujeira.
e) pontos de luminárias com infiltração na entrada dos banheiros do 7º andar;
f) um fato comum em praticamente todos os andares é o grande acúmulo de fiação exposta em contato com materiais inflamáveis;
g) precárias condições de uso de tomadas e plugs em diversos setores, apresentando situações de risco iminente aos seus usuários.
3. Subestação elétrica:
a) ausência de barreiras (anteparos) nos módulos de força e caixas de disjuntores, o que possibilita a ocorrência de acidentes graves envolvendo risco elétrico;
b) falta de sinalização de advertência para a entrada da subestação. Sendo necessário instalar frases de avertência "Cuidado Painel Elétrico e "Não é permitido acesso a pessoas não autorizadas";
c) os circuitos não possuem indicação de liga-desliga e indicação de circuito que corresponde os disjuntores;
d) os profissionais que supervisionam a área não possuem treinamento específico de NR 10 e combate a princípios de incêndio, bem como, não receberam instruções através de ordens de serviço para a permanência no local.
4. Arranjo Físico:
a) quanto a esse ponto, foi observado, em praticamente todos os andares, excesso de materiais e equipamentos em corredores e áreas de circulação de pessoas e materiais, o que gera grande risco aos servidores e, em alguns casos, fadiga osteomusculares;
b) grande desconforto acústico no 6º andar com níveis de ruído na faixa de 70 dB(A), acima dos limites de tolerância estabelecidos pela NR-17 e NBR 10152. Existe equipamento de climatização instalado nos corredores de circulação.
5. Prevenção e Combate a Incêndios
a) falta de mangueira no térreo e no 4º andar, bem como, o acoplamento do hidrante no 13º andar. As caixas de mangueiras estavam em péssimas condições de uso, apresentando desgastes excessivos e irregularidades, tais como: ferrugens, portas emperradas, fechaduras e vidros quebrados, falta de sinalização. Estes pontos são preocupantes, uma vez que, são acessórios de grande necessidade na ocasião de um sinistro. Irregularidades deste tipo são agravadas pelas restrições e peculiaridades do prédio, além do potencial de risco de todos os setores;
b) o alcance dado pelo único lance de mangueira existente nas caixas é insuficiente para atender os diversos setores do pavimento, o que seria de grande risco caso venha a ocorrer um incêndio em algum ponto mais afastado do hidrante;
c) a existência de um único tipo de esguicho (jato sólido) não é recomendada para o combate a incêndios, pois não permite a alternância entre a modalidade de sólido e neblina, dificultando, assim, o combate ao fogo;
d) os extintores estão instalados a uma altura superior a 1.65m, o que dificulta a retirada do equipamento e está em desacordo com as determinações legais (NR-23);
e) não foi observado, em nenhum dos pavimentos, sinalização das saídas de emergência e trotas de fuga e evacuação;
f) inexistência de sinalização de emergência em caso de pane do sistema elétrico;
g) gerador do prédio (gerador a diesel) encontra-se inoperante há muito tempo, gerando grande risco a todos os usuários e servidores desta secretaria.
6. Ergonomia
a) andares com salas e corredores sem climatização;
b) andares climatizados com aparelhos de ar condicionado de parede posicionados de maneira errada co o compressor para dentro das salas, ocasionando ruídos incômodos para os trabalhadores e elevando a temperatura interna no ambiente de trabalho;
c) andares sem climatização, com ventilação natural inadequada, com temperatura interna elevada, causando total desconforto e irritabilidade aos trabalhadores naquele ambiente de trabalho.
7. Iluminação:
a) existem calhas incompletas, sem lâmpadas e filtros, ocasionando ofuscamento e reflexos incômodos, sombras e contraste excessivos;
b) salas com janelas sem persianas;
c) m algumas salas, os postos de trabalho não estão posicionados de lado para as janelas, ocasionando reflexos indesejáveis, principalmente na tela do computador;
8. Mobília:
a) salas com mesas e cadeiras que proporcionam ao trabalhador má postura, visualização e operação;
b) salas com assentos sem apoio para os braços, sem rodízios e não são reguláveis;
c) ausência de suporte para os pés, caso seja necessário seu uso;
d) ausência de suporte para documentos nos trabalhos de leitura e digitação nos computadores;
e) salas com áreas de trabalho sem condições adequadas para movimentação dos segmentos corporais.
9. Elevadores:
a) há indícios que a empresa de manutenção não cumpre com a cláusula contratual que determina que as peças devem ser substituídas por peças originais de fábrica, sendo que o serviço de substituição de peças não é supervisionado, o que impede a comprovação sobre a procedência de originalidade das peças trocadas;
b) existência de fiação e conexões em mau estado de conservação;
c) ausência de peças, como alguns cabos de tração;
d) indícios de vazamento de óleo na máquina de tração do elevador;
e) limitadores de velocidade sem evidências de teste de funcionalidade;
f) lona de freio com desgaste acentuado;
g) indícios de desqualificação dos cabos de tração;
h) chave de proteção de acesso ao poço não atende às especificações atualmente exigidas;
i) distância do contra-peso para o pára-choque abaixo do mínimo permitido;
j) sistemas de comunicação de emergências inoperantes;
k) botão de NP inoperante;
l) polia ligeiramente arriada.
Mais à frente, a referida peça técnica elenca as medidas recomendadas para a adequação das condições ambientais e estruturais do prédio vistoriado (ID e6fa777).
Consta, ainda, do caderno processual Relatório de Vistoria Técnica elaborado pelo Corpo de Bombeiros (ID 8d37d41), que, após apontar as irregularidades verificadas quanto às normas de proteção de incêndio e pânico, conclui o seguinte:
"Diante dos fatos, o Serviço Técnico de Engenharia (SERTEN) do Corpo de Bombeiros Militar, é do parecer pela adoção de medidas corretivas da não-conformidade supracitada, em caráter de urgência, pois existe risco de prejuízos humanos e materiais. Existe a necessidade de se apresentar projetos arquitetônicos e de combate a incêndio de todo o complexo hospitalar, para análise junto ao SERTEN/CBMRN, a fim de se garantir a segurança contra incêndio e pânico da edificação.
No entanto, informamos que a competência da Seção de Vistoria e Investigação de Sinistro desta Corporação, restringe-se apenas aos aspectos relacionados à proteção contra incêndio e pânico, conforme parágrafo 4º, art. 24 do Regulamento Geral do CBMRN (Dec. 16.038 de 22 de março de 2002), portanto, as questões de ordem estritamente técnicas, relativas às instalações elétricas, instalações de Gás Liquefeito de Petróleo, infiltrações, deformidades estruturais, estruturas metálicas, vícios construtivos ou anomalias de qualquer natureza, devem ser fiscalizadas por profissionais com qualificação específica e devidamente habilitados junto ao Conselho Regional de Engenharia, Arquitetura e Agronomia do RN - CRERA/RN - sendo estes os responsáveis legais na órbita penal, civil e administrativa em caso de dano à pessoa ou patrimônio." (grifos acrescidos)
A partir do teor dos laudos técnicos trazidos aos autos - e não impugnados pela parte ré - não restam dúvidas da gravidade da situação de precariedade e perigo a que se encontram expostos os trabalhadores que atuam no prédio da SESAP.
A tese da parte ré é no sentido de que já teria dado início aos processos administrativos destinados à reforma e adequação do prédio, de modo que estaria adotando espontaneamente as providências cabíveis para a solução dos problemas identificados, alertando, de outro lado, a necessidade de cumprir as normas orçamentárias existentes.
Tem-se, porém, que, embora afirme não opor qualquer resistência à adoção das medidas corretivas necessárias, o Estado do Rio Grande do demonstra claramente não dispensar à questão a atenção e a urgência que o caso requer, ignorando até mesmo o considerável risco de vidaa que se submetem diariamente os trabalhadores e cidadãos que frequentam a sede da SESAP, inclusive o titular da pasta (cf.: ata de audiência de ID 4fd15, p. 1).
Com efeito, o relatório técnico de ID d2f8437 foi elaborado por órgão pertencente à própria Administração Estadual em junho de 2010 e,passados mais de 5 anos, ainda persistem nos dias atuais os graves problemas ambientais e falhas de ordem estrutural do edifício.
Evidentemente, os possíveis entraves de ordem orçamentária e burocrática já poderiam ter sido superados ao longo desses anos, caso houvesse, de fato, vontade e esforço do Poder Público em solucionar a questão, até mesmo porque o quadro de emergência verificado, e formalmente diagnosticado desde 2010, capaz de comprometer a segurança das pessoas, seria suficiente para justificar a contratação direta de empresa, mediante dispensa de licitação, para a realização dos serviços considerados mais urgentes (cf. art. 24, IV, da Lei 8.666/93).
A mera abertura de processos administrativos, já no ano de 2015, destinados à adoção de medidas de adequação do edifício não afasta, por si só, a situação de inércia da Administração Pública Estadual na espécie, já que, até o momento, pouco ou nada foi feito para mitigar a situação periclitante encontrada naquele ambiente de trabalho.
Após a audiência de 10.09.2015, o réu procedeu a juntada de vários documentos (ID 44994b2), dentre os quais o Laudo de Vistoria Técnica de Engenharia da SESAP(ID 23d998b), já elaborado após a propositura da presente demanda, por órgão técnico vinculado à própria Secretaria de Saúde, concluindo que: "[...] os ambientes que constituem a atual sede da SESAP não apresentam riscos relevantes imediatos ao seu pleno funcionamento, encontrando-se em estado de manutenção regular" (ID 47d2564 - Pág. 5), ainda que assente a necessidade de ampla reforma no sistema elétrico e de proteção contra incêndios.
No entanto, ao longo de todo o laudo - e na linha do que colocado em Juízo pela presente demanda - o expert reconhece riscos (em diferentes graus) e a precariedade e a necessidade de intervenção em relação a vários aspectos funcionais do edifício, como o hidráulico e o combate a incêndio, este avaliado como gerador de risco crítico.
O panorama geral desse documento técnico, produzido por órgão do réu, é indicativo da certeza processual já apontada na decisão liminar, mesmo porque quando se trata da proteção à vida humana no ambiente de trabalho, não é possível a tolerância a tantos agentes de potencial lesão à higidez e integridade dos indivíduos, nomeadamente diante dos incidentes já documentados.
As fotografias acostadas ao referido laudo (ID d51c07c - Pág. 4 e ss.) oferecem iconográfica noção do grau de precariedade das instalações do prédio e necessidade da adoção de providências urgentes, que passam longe daquelas indicadas no documento em apreço, quais sejam a mera abertura de processos administrativos, sem qualquer informação quanto ao avanço dessas medidas na velocidade reclamada pelo caso.
Convém ressaltar que a questão acerca da possibilidade de o Poder Judiciário determinar a promoção de medidas ou execução de obras emergenciais pela Administração Pública restou recentemente pacificada pelo Supremo Tribunal Federal por ocasião julgamento do RE 592.581, em tema com repercussão geral reconhecida.
Apesar de o respectivo acórdão ainda não ter sido publicado, o Informativo n. 794 da Corte Suprema, de agosto de 2015, divulgou o resumo do julgamento, nos seguintes termos:
"Obras emergenciais em presídios: reserva do possível e separação de poderes - 1
É lícito ao Poder Judiciário impor à Administração Pública obrigação de fazer, consistente na promoção de medidas ou na execução de obras emergenciais em estabelecimentos prisionais para dar efetividade ao postulado da dignidade da pessoa humana e assegurar aos detentos o respeito à sua integridade física e moral, nos termos do que preceitua o art. 5º, XLIX, da CF, não sendo oponível à decisão o argumento da reserva do possível nem o princípio da separação dos poderes. Essa a conclusão do Plenário, que proveu recurso extraordinário em que discutida a possibilidade de o Poder Judiciário determinar ao Poder Executivo estadual obrigação de fazer consistente na execução de obras em estabelecimentos prisionais, a fim de garantir a observância dos direitos fundamentais dos presos. O Colegiado assentou tratar-se, na espécie, de estabelecimento prisional cujas condições estruturais seriam efetivamente atentatórias à integridade física e moral dos detentos. Pontuou que a pena deveria ter caráter de ressocialização, e que impor ao condenado condições subumanas atentaria contra esse objetivo. Entretanto, o panorama nacional indicaria que o sistema carcerário como um todo estaria em quadro de total falência, tendo em vista a grande precariedade das instalações, bem assim episódios recorrentes de sevícias, torturas, execuções sumárias, revoltas, superlotação, condições precárias de higiene, entre outros problemas crônicos. Esse evidente caos institucional comprometeria a efetividade do sistema como instrumento de reabilitação social. Além disso, a questão afetaria também estabelecimentos destinados à internação de menores. O quadro revelaria desrespeito total ao postulado da dignidade da pessoa humana, em que haveria um processo de "coisificação" de presos, a indicar retrocesso relativamente à lógica jurídica atual. A sujeição de presos a penas a ultrapassar mera privação de liberdade prevista na lei e na sentença seria um ato ilegal do Estado, e retiraria da sanção qualquer potencial de ressocialização. A temática envolveria a violação de normas constitucionais, infraconstitucionais e internacionais. Dessa forma, caberia ao Judiciário intervir para que o conteúdo do sistema constitucional fosse assegurado a qualquer jurisdicionado, de acordo com o postulado da inafastabilidade da jurisdição. Os juízes seriam assegurados do poder geral de cautela mediante o qual lhes seria permitido conceder medidas atípicas, sempre que se mostrassem necessárias para assegurar a efetividade do direito buscado. No caso, os direitos fundamentais em discussão não seriam normas meramente programáticas, sequer se trataria de hipótese em que o Judiciário estaria ingressando indevidamente em campo reservado à Administração. Não haveria falar em indevida implementação de políticas públicas na seara carcerária, à luz da separação dos poderes. Ressalvou que não seria dado ao Judiciário intervir, de ofício, em todas as situações em que direitos fundamentais fossem ameaçados. Outrossim, não caberia ao magistrado agir sem que fosse provocado, transmudando-se em administrador público. O juiz só poderia intervir nas situações em que se evidenciasse um "não fazer" comissivo ou omissivo por parte das autoridades estatais que colocasse em risco, de maneira grave e iminente, os direitos dos jurisdicionados.
RE 592581/RS, rel. Min. Ricardo Lewandowski, 13.8.2015. (RE-592581)
Obras emergenciais em presídios: reserva do possível e separação de poderes - 2
O Ministro Edson Fachin ponderou que a cláusula da reserva do possível somente seria oponível se objetivamente verificado o justo motivo que tivesse sido suscitado pelo poder público para não realizar o mandamento constitucional. Seria preciso ponderar que o magistrado não deveria substituir o gestor público, mas poderia compeli-lo a cumprir o programa constitucional vinculante, mormente quando se tratasse de preservar a dignidade da pessoa humana. O Ministro Roberto Barroso aduziu que a judicialização não substituiria a política, mas haveria exceções, como no caso, em que se trataria de proteger os direitos de uma minoria sem direitos políticos, sem capacidade de vocalizar as próprias pretensões. Além disso, se cuidaria de um problema historicamente crônico de omissão do Executivo, e se o Estado se arrogasse do poder de privar essas pessoas de liberdade, deveria exercer o dever de proteção dessas pessoas. O Ministro Luiz Fux reforçou a ideia de que a intervenção judicial seria legítima se relacionada a obras de caráter emergencial, para proteger a integridade física e psíquica do preso. A Ministra Cármen Lúcia lembrou que determinadas políticas, como de melhoria do sistema penitenciário, seriam impopulares com o eleitorado, mas isso não justificaria o descumprimento reiterado de um mandamento constitucional. Ademais, não caberia falar em falta de recursos, tendo em vista a criação do Fundo Penitenciário, para suprir essa demanda específica. O Ministro Gilmar Mendes salientou que a questão não envolveria apenas direitos humanos, mas segurança pública. Presídios com condições adequadas permitiriam melhor policiamento, melhor monitoramento e dificultariam o crescimento de organizações criminosas nesses locais. Frisou que a lei contemplaria hipótese de o juiz da execução poder interditar estabelecimento penal que funcionasse em condições inadequadas ou ilegais, bem assim que caberia às corregedorias e ao Ministério Público zelar pelo correto funcionamento desses estabelecimentos. O Ministro Celso de Mello afirmou que a hipótese seria de excesso de execução - em que o Estado imporia ao condenado pena mais gravosa do que a prevista em lei -, portanto de comportamento estatal ao arrepio da lei.
RE 592581/RS, rel. Min. Ricardo Lewandowski, 13.8.2015. (RE-592581)"
Dos argumentos levantados no julgamento em tela, depreende-se que, diante da violação de direito fundamental, é possível ao Poder Judiciário determinar ao Poder Executivo estadual obrigação de fazer consistente na execução de obras, em ordem a assegurar a efetividade do direito buscado, não sendo oponível à decisão o argumento da reserva do possível nem o princípio da separação dos poderes.
No caso em tela, o que se busca tutelar não é apenas a saúde dos trabalhadores lotados na sede da SESAP (efetivos, terceirizados e demais prestadores de serviço), mas a sua própria vida, que está sob ameaça real e constante.
O direito à vida é, como se sabe, direito fundamental de primeira geraçãoe, dentre todos, talvez o mais importante, porquanto pressuposto de todos os demais direitos e liberdades do indivíduo.
Nesse sentir, é de causar espanto a prolongada omissão da Administração Estadual diante do risco a que estão submetidos aqueles que lhes prestam serviços, cujas condições de trabalho são claramente temerárias e indignas.
Ademais, há de se ressaltar que, até o presente momento, o Estado do Rio Grande do Norte não apresentou a este Juízo o plano de atendimento das obrigações relacionadas nos itens 109, I, II, III e IV da petição inicial, conforme determinado na decisão interlocutória de ID 0ca74b8, na qual foi assinado o prazo de 30 dias para seu cumprimento.
Passados mais de 14 mesesda concessão da referida medida de urgência, o referido comando judicial permanece descumprido pela Administração Estadual, o que igualmente corrobora o quadro de inércia do réu.
Com efeito, como já sublinhado, a mera abertura de processos administrativos para adoção das medidas corretivas necessárias à adequação do edifício da SESAP não atende à determinação emanada deste Juízo, já que nenhum plano de execução foi apresentado pelo Poder Público, tampouco houve a comprovação de que as obrigações relacionadas nos itens 109, I, II, III e IV da petição inicial vieram a ser cumpridas neste ínterim.
Na audiência de ID 4fdf155, o i. representante da Procuradoria do Estado do Rio Grande do Norte, indicou a impossibilidade de atendimento da pretensão deduzida em Juízo por três motivos: os prazos e trâmites dos processos de licitação; as barreiras orçamentárias; e o problema da propriedade do imóvel. Neste último aspecto, ressaltou que o prédio, apesar de ocupado pela Administração Estadual, pertence ao Instituto Nacional do Seguro Social (INSS), sendo o Estado do RN o seu promitente comprador, aquisição que não foi efetivada por falta de pagamento integral do valor.
No tocante aos dois primeiros óbices, é apenas de se reiterar que, em determinadas circunstâncias que a realidade impõe, é preciso priorizar medidas urgentes quando se trata de encargo do Poder Público indelegável na proteção de bens jurídicos relevantes. Nos autos, não está demonstrado que houve essa priorização, mormente quando se protege direitos fundamentais de primeira geração. De outro lado, também já foi destacado o instrumento legal de agilização burocrática, na medida em que a Lei de Regência das Licitações permite a dispensa do processo licitatório em casos urgentes.
Essa medida de dispensa de licitação foi recentemente cogitada pelo Tribunal Regional Federal, no caso da interdição judicial do prédio da Superintendência do Desenvolvimento do Nordeste - SUDENE, que abrigava diversos órgãos da própria Justiça do Trabalho (cf.: Proc. 0803962-94.2015.4.05.0000 - Suspensão de Liminar, despacho da Presidência, 30.07.2015). Na oportunidade, foi determinada a adoção de diversas medidas de adequação do prédio, inclusive no que se refere às instalações elétricas, hidráulicas e de proteção contra incêndio, "podendo para tanto se valer das exceções previstas na legislação orçamentária e de licitações e contratos públicos, dada situação de emergência que se verifica".
Registro que, apesar da tutela judicial de interdição/levantamento da interdição mediante encargos judicialmente impostos ao Condomínio de órgãos públicos que ocupam o citado imóvel, fato é que a Justiça do Trabalho acabou transferindo todas as Varas da capital de Pernambuco para outra localidade, de forma provisória, até que se resolva definitivamente o problema da alocação dessas unidades jurisdicionais em local apropriado e definitivo.
Também não procede a tese de resistência do réu quanto à apontada impossibilidade de realização de despesas em imóvel cujo domínio não foi transferido para o Estado do Rio Grande do Norte. Ainda que não documentado adequadamente nos autos, alega o réu que o imóvel ainda não foi passado formalmente para o seu patrimônio. Contudo, mesmo na condição de promitente-comprador, nada impede a realização de despesas públicas relacionadas a obras de reforma no imóvel, porquanto são reais os direitos adquiridos pelo promitente-comprador do imóvel, nos termos do art. 1.225 do Código Civil Brasileiro. Ademais, haveríamos de considerar a alegação autêntico venire contra factum proprium, já que o réu, como demonstram os autos, não cogitou essa questão ao deflagrar diversos processos administrativos para a recuperação das instalações do imóvel.
Afastadas as questões jurídicas de resistência, reitero o quadro de ausência de impugnação específica, na contestação de ID e7462d4 (p. 17 e ss.) quanto às providências (obrigações de fazer) requeridas pelo Ministério Público nesta ação civil, oportunidade em que limitou-se a indicar algumas providências já em curso e a necessidade de expressa autorização judicial para a realização de despesas com dispensa de licitação.
Diante de todo o exposto, reconhecida a violação a diversos direitos fundamentais dos trabalhadores lotados no prédio da SESAP, dentre eles o direito à vida, à saúde e à dignidade da pessoa humana, ratifico a decisão interlocutória (ID 0ca74b8) para, acolhendo o pedido deduzido na exordial, determinar ao réu, Estado do Rio Grande do Norte, a comprovação do adimplemento das seguintes obrigações de fazer, nos prazos e condições que se seguem:
a) no prazo de até 90 (noventa) dias, a contar da publicação desta sentença, as obrigações de fazer descritas nos itens I e II da inicial (ID bfa7ea5a9, p. 59-69);
b) no prazo de até 180 (cento e oitenta) dias, a contar da publicação desta sentença, as obrigações de fazer descritas nos itens II e IV da inicial (ID bfa7ea5a9, p. 59-69).
A comprovação do adimplemento das referidas obrigações será examinada, de forma individualizada, na fase de cumprimento da sentença, com auxílio de expertdesignado pelo Juízo, se o caso assim o reclamar.
Para a consecução das obrigações em tela, e tendo presente i) a urgência de sua concretização para assegurar a higidez do meio ambiente de trabalho; ii) o que consta do art. 24 e 26, parágrafo único, inciso I, da Lei n. 8.666/93 (Lei de Regência das Licitações Públicas), assento que o caso reclama a situação emergencial, a justificar a dispensa de licitação.
De outro lado, tratando-se de obrigação e fazer, deve o julgador adotar medidas que assegurem o resultado prático da ordem, nos termos do art. 461, do Código de Processo Civil, de aplicação subsidiária ao Processo do Trabalho:
Art. 461. Na ação que tenha por objeto o cumprimento de obrigação de fazer ou não fazer, o juiz concederá a tutela específica da obrigação ou, se procedente o pedido, determinará providências que assegurem o resultado prático equivalente ao do adimplemento.
.................................................................................................
§ 4º. O juiz poderá, na hipótese do parágrafo anterior ou na sentença, impor multa diária ao réu, independentemente de pedido do autor, se for suficiente ou compatível com a obrigação, fixando-lhe prazo razoável para o cumprimento do preceito.
.................................................................................................
§ 5º. Para a efetivação da tutela específica ou a obtenção do resultado prático equivalente, poderá o juiz, de ofício ou a requerimento, determinar as medidas necessárias, tais como a imposição de multa por tempo de atraso, busca e apreensão, remoção de pessoas e coisas, desfazimento de obras e impedimento de atividade nociva, se necessário com requisição de força policial.
.................................................................................................
Assim, findo os prazos acima concedidos, e não comprovado nestes autos o cumprimento das obrigações, fixo, nos termos do § 4º do art. 461 do Código de Processo Civil, de aplicação supletiva, multa diária de R$ 10.000,00 (dez mil reais), com marco final no prazo sucessivo de 45 (quarenta e cinco) dias.
Exaurido esse ciclo procedimental e persistindo a inadimplência total ou parcial do réu, a pendência obrigacional demandará outros meios coercitivos.
Nessa perspectiva assecuratória do resultado prático da ordem de cumprimento da obrigação de fazer, e tendo em vista o que consta do art. 161 da Consolidação das Leis do Trabalho - que cogita da hipótese de interdição de estabelecimento - aqui tomado de forma analógica -, combinado com o disposto no § 5º do multimencionado art. 461 do CPC, estabeleço a possibilidade de decretação de interdição judicialdo prédio sede da SESAP, em ordem a garantir a eficácia das obrigações exequendas - que versam sobre segurança e saúde no meio ambiente de trabalho -, e a própria dignidade do Poder Judiciário.
Essa medida se impõe prever, pois: a) o Poder Judiciário pode adotar providência que já está prevista, inclusive na seara administrativa, para ser adotada pela autoridade da fiscalização do trabalho; b) as astreintes, embora se constituam meio coercitivo de grande relevo, não podem implicar cumulação de multa diária a perdurar por muito tempo, frustrando a eficácia da ordem, e canalizando essa frustração para resultar em outro procedimento de custo de recursos públicos e de tempo: a execução forçada, especialmente quando se trata de ente público no pólo passivo, a quem se assegura, pelo regime constitucional vigente, a execução indireta das dívidas da Fazenda Pública, por meio do mecanismo do precatório judicial.
Caso se atinja esse patamar da sequência desenhada para a efetivação das obrigações determinadas neste decreto judicial, presente estará o propósito de concretização do preceito da duração razoável do processo (art. 5º, LXXVIII, CF), na medida em que confere envergadura aos meios executivos para a efetividade processual.
2.2. Da multa decorrente do descumprimento da decisão interlocutória
Como já assentado no capítulo anterior desta sentença, o Estado do Rio Grande do Norte descumpriu a determinação contida na decisão interlocutória de ID 0ca74b8, no sentido de apresentar a este Juízo, no prazo de 30 dias, plano de atendimento das obrigações relacionadas nos itens 109, I, II, III e IV da petição inicial.
Na referida decisão antecipatória, restou estabelecido que o não atendimento da ordem ali constante implicaria em: a) multa diária de R$ 50.000,00, em caso de atraso no cumprimento da ordem judicial, que será apurada até o período de 15 dias de inércia do réu; b) interdição do prédio da SESAP - Secretaria de Saúde do Estado do Rio Grande do Norte, situado na Av. Marechal Deodoro da Fonseca, n. 730, Cidade Alta, Natal/RN, sem prejuízo da cominação de outras medidas necessárias à efetivação desta tutela (cf.: art. 461,§§ 4º e 5º do CPC, de aplicação supletiva), caso persistisse a inércia em período superior a 15 dias.
Assim, não tendo sido apresentado, até a presente data, o plano de atendimento, conforme determinado por este Juízo, condeno o Réu ao pagamento de multa no valor de R$ 750.000,00, decorrente do descumprimento da medida de urgência deferida nos autos.
2.3. Do dano moral coletivo
Requer o Ministério Público, ainda, a condenação da ré no pagamento de indenização por dano moral coletivo, pugnando por uma soma equivalente a R$ 20.000.000,00 (vinte milhões de reais), considerando os seguintes fatores:
"1) a expressiva quantidade de servidores e empregados "terceirizados" atingidos pela prática ilícita do réu, que, com seu total descaso pela suas segurança, os mantém laborando em prédio com alto risco de incêndio;
2) a ocorrência de incêndios anteriores, e, não obstante isso, a total negligência do réu em afastar os riscos laborais; 3) o grau de reprovabilidade social na prática do Estado do Rio Grande do Norte de não adotar medidas para redução dos riscos do trabalho, e, ao contrário despender recursos para outros setores não fundamentais, como publicidade;
3) a gravidade, a natureza, a abrangência e a repercussão das condutas ilícitas denunciadas, a atingir e lesionar toda a coletividade de trabalhadores (servidores e empregados de empresas contratadas) e o público em geral, que transita no prédio da SESAP;
4) a imperiosidade de ser imposta uma condenação de natureza pecuniária que signifique reparação e sancionamento eficaz ao réu, medida que se apresenta como mecanismo adequado de responsabilização jurídica, no plano da tutela dos direitos coletivos e difusos (art. 1º e 13 da Lei nº 7.347/85 e art. 6º, VII, e 83, do CDC)."
(ID bfa7eaa, pp. 54-55)
Sobre as linhas conceituais acerca dessa modalidade de dano, assentei em precedente (Ação Civil Pública n. 1762/2009 - 2ª Vara do Trabalho de Natal) o seguinte:
"Em obra específica sobre o tema, Xisto Tiago de Medeiros Neto, valendo-se do magistério de Carlos Alberto Bittar Filho, assenta que o dano moral coletivo corresponde "à injusta lesão da esfera moral de uma dada comunidade, constituindo a violação antijurídica de um determinado círculo de valores coletivos" (Dano moral coletivo. São Paulo: LTr, 2004, p. 137), relacionando, em seguida, os elementos que caracterizam essa estirpe de dano:
a) conduta antijurídica (ação ou omissão) do agente, pessoa física ou jurídica;
b) ofensa significativa e intolerável a interesses extrapatrimoniais, identificados no caso concreto, reconhecidos e inequivocamente compartilhados por uma determinada coletividade (comunidade, grupo, categoria ou classe particular de pessoas titular de tais interesses protegidos pela ordem jurídica);
c) a percepção do dano causado, correspondente aos efeitos, ispo facto, emergem coletivamente, traduzidos pela sensação de desvalor, de indignação, de menosprezo, de repulsa, de inferioridade, de descrédito, de desesperança, de aflição, de humilhação, de angústia ou respeitante a qualquer outra conseqüência de apreciável conteúdo negativo;
d) nexo causal, observado entre a conduta ofensiva e a lesão socialmente apreendida e repudiada (cf. MEDEIROS NETO, 2004, p. 137-8).
Noutras palavras, trata-se de uma reparação cuja titularidade não é um sujeito individual ou específico, senão que a própria coletividade (cf. parágrafo único, art. 1º da Lei n. 8.884/94, em exame analógico)."
Quanto à questão probatória, "a responsabilidade do ofensor, em regra, independe de configuração de culpa, decorrendo, pois, do próprio fato da violação, ou seja, revela-se 'damnum in re ipsa'" (MEDEIROS NETO, 2004, p. 152).
No caso destes autos, os elementos de convicção trazidos a lume indicam, de forma insofismável, a conduta ilícita do Estado do Rio Grande do Norte, com reiteradas e sistemáticas lesões a diversos preceitos legais atinentes tutela do meio ambiente trabalho, inclusive expondo a risco de vida os servidores e trabalhadores terceirizados que atuam no edifício-sede da SESAP.
As diversas infrações descortinam um quadro que, além de lesivo à coletividade dos trabalhadores, também é lesivo à sociedade, na medida que passa a ensejar a atuação do Estado, inclusive do Estado-Juiz, na consecução de atos para a sua reparação, conduta que não merece passar in albis.
Noutras palavras, as atitudes lesivas à ordem pública configuram um contexto de repulsa, e, de fato, são idôneos para configurar dano moral coletivo, até mesmo como meio pedagógico de ajustar a conduta do réu.
A ofensa aos valores sociais do trabalho e, no limite, à própria dignidade do trabalhador é atitude contrária, de forma literal e direta, à Constituição da República, mormente quando se expõe os trabalhadores a risco iminente de incêndios e outros acidentes, que colocam sob ameaça suas próprias vidas.
E é nesse contexto de ofensa à ordem jurídica de modo grave, sistemático e desproporcional que reside a transindividualidade do dano, na medida em que toda a sociedade - e não somente um indivíduo ou um grupo restrito de pessoas - é prejudicada pela ação da parte promovida.
A jurisprudência tem admitido a sanção - mediante dano moral coletivo - quando a precarização se projeta de forma significativa no meio social. Eis precedentes:
INDENIZAÇÃO POR DANO IMATERIAL COLETIVO. RESPONSABILIDADE CIVIL. EVOLUÇÃO JURÍDICA. DESENVOLVIMENTO DE CATEGORIAS APTAS A LIDAR COM VIOLAÇÕES DE DIREITOS TRANSINDIVIDUAIS - REPARAÇÃO DE LESÃO OFENSIVA AOS VALORES FUNDANTES DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL DE 1988. NÃO PREENCHIMENTO DAS VAGAS RESERVADAS PARA PESSOAS COM DEFICIÊNCIA. ART. 93 DA LEI Nº 8.213/91. OFENSA A DIREITO DIFUSO. DIREITO FUNDAMENTAL À IGUALDADE MATERIAL. EFICÁCIA HOROZONTAL DOS DIREITOS FUNDAMENTAIS. A evolução das concepções jurídicas acerca da responsabilidade civil, que caminha desde o reconhecimento restrito do dano material, passando pela admissibilidade do dano moral individual, até o reconhecimento, à luz dos marcos da Constituição Federal de 1988, da necessidade de reparação da coletividade, quando atingidos, por meio de conduta ilícita, valores assentados na Carta de 1988 e que detém titularidade transindividual, torna imperativa a afirmação do direito à reparação por dano imaterial coletivo, que, de forma tecnicamente inadequada vem sendo denominado dano moral coletivo. É importante que se ressalte que, assim como a denominação, que se refere aos direitos de natureza individual, os pressupostos para o reconhecimento da responsabilidade em razão dessa espécie de dano são diversos, revelando a insuficiência dos paradigmas do direito liberal clássico para lidar com as novas categorias jurídicas transindividuais. Nesse contexto, resulta incabível perquirir, na conduta da ré no caso concreto, a existência de incômodo moral com gravidade suficiente a atingir não apenas o patrimônio jurídico dos trabalhadores envolvidos, mas o patrimônio de toda a coletividade. O que releva investigar, no caso em tela, é a gravidade da violação infligida pela ré à ordem jurídica. A coletividade é tida por ofendida, imaterialmente, a partir do fato objetivo da violação da ordem jurídica. Assim, verificado nos autos que a ré, não obstante instada pelo Ministério Público do Trabalho a firmar termo de ajuste de conduta, resistiu por quatro anos em não cumprir a cota de portadores de deficiência prevista no art. 93 da Lei nº 8.213/91, descumprindo, injustificadamente, norma garantidora do princípio da igualdade material e da não discriminação das pessoas portadoras de necessidades especiais e, por conseguinte, furtando-se à concretização de sua função social, é devida a reparação da coletividade pela ofensa aos valores constitucionais fundamentais. Recurso de revista não conhecido (RR-65600-21.2005.5.01.0072, Relator Ministro: Luiz Philippe Vieira de Mello Filho, Data de Julgamento: 06/06/2012, 4ª Turma, Data de Publicação: 22/06/2012).
RECURSO DE REVISTA. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. DIFERENÇAS DE PARTICIPAÇÃO NOS LUCROS E RESULTADOS DA EMPRESA. NULIDADE DO TERMO DE ADITAMENTO AO ACORDO COLETIVO. COAÇÃO. DIREITOS INDIVIDUAIS HOMOGÊNEOS. DANO MORAL COLETIVO. CONFIGURAÇÃO. 1. A reparação por dano moral coletivo, no âmbito das relações laborais, tem por escopo a repreensão de toda prática de conduta ilícita ofensiva da dignidade do trabalhador, revestindo-se de caráter pedagógico-preventivo. 2. No caso, a ação civil pública ajuizada pelo Ministério Público do Trabalho da 3ª Região objetiva a tutela de direito individual homogêneo, concernente ao pagamento de participação nos resultados relativa ao ano de 2003, mediante a declaração de nulidade do Termo de Aditamento ao Acordo Coletivo, ao fundamento de ter sido obtido por meio de autorização de seus empregados, à revelia da oposição do sindicato da categoria profissional e sob ameaça da perda do emprego, em prejuízo das regras firmadas no acordo coletivo em vigor, mais benéficas aos empregados. 3. A satisfação do interesse jurídico de índole patrimonial de mesma origem, contudo, não constitui obstáculo à configuração do dano moral coletivo, quando demonstrado que o ato ilícito perpetra ofensa aos valores maiores que a Constituição Federal visa preservar, circunstância em que se reveste de natureza transindividual. 4. A prática de coação na relação de trabalho, amplamente demonstrada, constitui conduta das mais repreensíveis e intoleráveis, que, por cercear a liberdade de manifestação de vontade, atinge os valores mais caros, concernentes à dignidade da pessoa do trabalhador e o direito de ser representado por seu sindicato de classe, de modo a extrapolar o interesse jurídico meramente individual, e atingir toda a coletividade de trabalhadores. 5. Configurado, pois, o ato ilícito, a indenização a título de dano moral coletivo decorre da interpretação sistemática dos arts. 5°, X, da CF/88, 186 do CCB e 81, parágrafo único, da Lei n° 8.078/90. COAÇÃO. TUTELA INIBITÓRIA. A tutela inibitória, passível de condenação nas ações coletivas e, em especial, nas ações civis públicas, como na espécie, é uma tutela específica que tem por objeto preservar a integridade do direito, o que significa que não objetiva repará-lo ou ressarci-lo, mas apenas assegurar que ele continue a ser exercido, livre de todo e qualquer vício que macule a sua manifestação. No caso, a pretensão se identifica com a abstenção da empresa de adotar conduta consubstanciada na prática de coação em relação aos seus empregados, que objetive a renúncia de direitos trabalhistas assegurados por acordo coletivo de trabalho, valendo-se, maliciosamente, da ausência da participação negocial do sindicato, legítimo representante da categoria. Recurso de revista parcialmente conhecido e provido (RR-85241-28.2005.5.03.0043, Relator Ministro: Walmir Oliveira da Costa, Data de Julgamento: 22/06/2011, 1ª Turma, Data de Publicação: 01/07/2011).
No caso de violação reiterada às normas de segurança e saúde do trabalho, colaciono alguns precedentes:
AGRAVO DE INSTRUMENTO. RECURSO DE REVISTA. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. MINISTÉRIO PÚBLICO DO TRABALHO. NEGLIGÊNCIA E DESRESPEITO A NORMAS DE PROTEÇÃO À SAÚDE E SEGURANÇA DOS TRABALHADORES. SUJEIÇÃO DA COLETIVIDADE DE TRABALHADORES AO RISCO DE ACIDENTES E COMPROMETIMENTO DA INTEGRIDADE FÍSICA E PSÍQUICA, INCLUSIVE COM A OCORRÊNCIA DE ÓBITO DECORRENTE DE ACIDENTE DE TRABALHO. CARACTERIZAÇÃO DE DANO MORAL COLETIVO. QUANTUM INDENIZATÓRIO (APLICAÇÃO DOS CRITÉRIOS DA RAZOABILIDADE E PROPORCIONALIDADE). DECISÃO DENEGATÓRIA. MANUTENÇÃO. A prática adotada pela Ré - consistente em descumprir reiteradamente normas ligadas a saúde e segurança no ambiente de trabalho, inclusive expondo os empregados a um sistema de trabalho permanente em sobrejornada - contrapõe-se aos princípios basilares da nova Constituição, mormente àqueles que dizem respeito à proteção da dignidade humana e da valorização do trabalho humano (art. 1º, III e IV, da CR/88), sendo forçoso concluir pela manutenção da condenação da Ré ao pagamento de indenização por dano moral coletivo, no valor de RS 80.000,00 (oitenta mil reais), destinado ao FNDE. Registre-se que os critérios da razoabilidade e proporcionalidade foram observados no caso em análise, em que o direito lesado se referiu ao descumprimento da legislação trabalhista no tocante às normas de proteção à saúde e segurança dos trabalhadores. Assim, não há como assegurar o processamento do recurso de revista quando o agravo de instrumento interposto não desconstitui os termos da decisão denegatória, que subsiste por seus próprios fundamentos. Agravo de instrumento desprovido. (TST - AIRR: 1166000420115170008, Relator: Mauricio Godinho Delgado, Data de Julgamento: 18/12/2013, 3ª Turma, Data de Publicação: DEJT 31/01/2014)
Diante desse quadro, defiro, em parte, o pedido formulado na inicial, e fixo a indenização por dano moral coletivo em R$ 2.000.000,00, considerando os aspectos de gravidade dos fatos, sua projeção social, e as aparentes condições econômica da parte ré.
O valor da indenização é fixada em valores contemporâneos a esta decisão, a partir de quando deverão ser atualizados, incidindo juros de mora ex lege (cf. Súmula 439 do TST: "nas condenações por dano moral, a atualização monetária é devida a partir da data da decisão de arbitramento ou de alteração do valor. Os juros incidem desde o ajuizamento da ação, nos termos do art. 883 da CLT").
2.4. Da destinação dos valores atinentes às multas consolidadas e eventualmente apuradas no cumprimento das obrigações de fazer e da indenização por dano moral coletivo
Em relação à multa decorrente do não cumprimento da liminar e consolidada no capítulo 2.2. supra, bem como na hipótese descumprimento das obrigações de fazer contidas nesta decisão, é importante cogitar sobre os mecanismos de destinação dos respectivos valores.
De igual sorte, é fundamental a definição da destinação da indenização por danos morais coletivos.
A petição inicial não indica a destinação proposta para os valores atinentes às rubricas em epígrafe.
O tema está assim disposto na legislação (LACP):
"Art. 13. Havendo condenação em dinheiro, a indenização pelo dano causado reverterá a um fundo gerido por um Conselho Federal ou por Conselhos Estaduais de que participarão necessariamente o Ministério Público e representantes da comunidade, sendo seus recursos destinados à reconstituição dos bens lesados.
§ 1º. Enquanto o fundo não for regulamentado, o dinheiro ficará depositado em estabelecimento oficial de crédito, em conta com correção monetária.
§ 2º. Havendo acordo ou condenação com fundamento em dano causado por ato de discriminação étnica nos termos do disposto no art. 1o desta Lei, a prestação em dinheiro reverterá diretamente ao fundo de que trata o caput e será utilizada para ações de promoção da igualdade étnica, conforme definição do Conselho Nacional de Promoção da Igualdade Racial, na hipótese de extensão nacional, ou dos Conselhos de Promoção de Igualdade Racial estaduais ou locais, nas hipóteses de danos com extensão regional ou local, respectivamente."
Até a criação do Fundo de Defesa de Direitos Difusos (FDD), pelo Decreto nº 1.306, de 9 de novembro de 1994, era prática assente a destinação das multas por descumprimento judicial - e indenizações - em tutelas coletivas para o Fundo de Amparo ao Trabalhador - FAT.
De logo, assento que a destinação das multas/indenização não está jungida ao princípio da congruência, isto é, não está subsumida à proposição descrita na inicial, já que não se trata de matéria titularizada pela parte autora, mesmo porque envolve uma questão de ordem pública, que se subsume ao crivo judicial.
Por outro lado, a literatura especializada vem cogitando o prestígio a outras soluções para os recursos decorrentes dessa espécie de indenização, como se vê do magistério de Enoque Ribeiro Santos:
Outra diferença fundamental entre o dano moral individual e coletivo encontra-se na destinação dos recursos: enquanto os valores atribuídos ao dano moral individual são carreados para os trabalhadores considerados individualmente lesados, aqueles oriundos do dano moral coletivo são destinados a fundos protetores de clientelas específicas (idoso, criança, adolescente, deficientes etc), ao FAT - Fundo de Amparo ao Trabalhador (Lei 7998/98), ou a entidades filantrópicas, sem fins lucrativos, por meio de doações em espécie ou in natura, sujeitas à prestação de contas(Disponível em www.trt9.jus.br. Acesso em 21.02.2013).
Logo, não é obrigatória a reversão ou destinação dos recursos provenientes de indenizações e multas fixadas em ações civis públicas ao FAT ou qualquer outro fundo, como parece cogitar, de forma restritiva, o art. 13 da LACP.
Compartilho do entendimento que melhor se ajusta à ideia de reparação do dano causado à coletividade a aplicação dos recursos provenientes da indenização em ações sociais, de preferência no universo temático do dano, a serem prestados nos domínios da própria a coletividade lesada.
Nesse sentido, o Enunciado n. 12 da I Jornada de Direito Material e Processual do Trabalho (Brasília, 2007):
AÇÕES CIVIS PÚBLICAS. TRABALHO ESCRAVO. REVERSÃO DA CONDENAÇÃO ÀS COMUNIDADES LESADAS. Ações civis públicas em que se discute o tema do trabalho escravo. Existência de espaço para que o magistrado reverta os montantes condenatórios às comunidades diretamente lesadas, por via de benfeitorias sociais tais como a construção de escolas, postos de saúde e áreas de lazer. Prática que não malfere o artigo 13 da Lei 7.347/85, que deve ser interpretado à luz dos princípios constitucionais fundamentais, de modo a viabilizar a promoção de políticas públicas de inclusão dos que estão à margem, que sejam capazes de romper o círculo vicioso de alienação e opressão que conduz o trabalhador brasileiro a conviver com a mácula do labor degradante. Possibilidade de edificação de uma Justiça do Trabalho ainda mais democrática e despida de dogmas, na qual a responsabilidade para com a construção da sociedade livre, justa e solidária delineada na Constituição seja um compromisso palpável e inarredável.
Ainda acerca da matéria, trago à colação interessante precedente jurisprudencial:
AÇÃO CIVIL PÚBLICA. MULTA EM CASO DE DESCUMPRIMENTO. DESTINAÇÃO. ENTIDADE A SER INDICADA PELO MINISTÉRIO PÚBLICO DO TRABALHO. Entendo que a ação civil pública possui regramento próprio que se impõe a respeito do beneficiário da multa a ser aplicada. O art. 13 da Lei nº 7.347/1985, prevê a destinação desses recursos à órgão ou entidade sem fins lucrativos indicadas pelo Ministério Público, portanto é incabível a reversão da multa ao sindicato da categoria profissional, ainda que seja esse o autor da ação civil pública. (TRT8, RO 0000145-02.2012.5.08.0127, Des. Rel. JOSÉ EDÍLSIMO ELIZIÁRIO BENTES, Data de Julgamento: 25.11.12)
Assim, desse modo, assento que a destinação dos valores atinentes às multas eventualmente fixadas e da indenização por dano moral coletivo será objeto de cognição especial e complementar na fase de cumprimento da sentença, quando será facultado ao Ministério Público do Trabalho formular proposta de aplicação desses recursos, com o estabelecimento do contraditório.
Assento, ainda, que, caso revertida a entidade filantrópica ou sem fins lucrativos, para aplicação em ações de cidadania em favor da sociedade, deverá a proposta vir acompanhada da obrigação de se firmar termo de compromisso para comprovação do uso dos recursos e respectiva prestação de contas.
II. Dispositivo
Ante o exposto, e de tudo mais que dos autos consta, JULGO PROCEDENTE, EM PARTE, o pedido deduzido na presente ação civil pública, proposta pelo MINISTÉRIO PÚBLICO DO TRABALHO (PROCURADORIA REGIONAL DO TRABALHO DA 21ª. REGIÃO), em face do ESTADO DO RIO GRANDE DO NORTE, para, ratificando os termos da decisão interlocutória (ID 0ca74b8) concessiva da tutela de urgência:
1. Condenar o réu a comprovar o adimplemento das seguintes obrigações de fazer, relativamente ao edifício onde funciona a Secretaria de Saúde do Estado do Rio Grande do Norte (SESAP/RN), nos prazos e condições que se seguem:
a) no prazo de até 90 (noventa) dias, a contar da publicação desta sentença, as obrigações de fazer descritas nos itens I e II da inicial (ID bfa7ea5a9, p. 59-69);
b) no prazo de até 180 (cento e oitenta) dias, a contar da publicação desta sentença, as obrigações de fazer descritas nos itens II e IV da inicial (ID bfa7ea5a9, p. 59-69).
2. Condenaro réu ao pagamento das seguintes obrigações, com os acréscimos e na forma previstos na legislação em vigor:
a) multa, no valor de R$ 750.000,00, decorrente do descumprimento da medida de urgência deferida nos autos, considerando-se, como dies a quo, o prazo máximo para o cumprimento da ordem, conforme previsto no capítulo 2.2. supra;
b) indenização por dano moral coletivo, no importe de R$ 2.000.000,00, em valores contemporâneos a esta decisão, a partir de quando deverão ser atualizados, incidindo juros de mora ex lege (cf. Súmula 439 do TST: "nas condenações por dano moral, a atualização monetária é devida a partir da data da decisão de arbitramento ou de alteração do valor. Os juros incidem desde o ajuizamento da ação, nos termos do art. 883 da CLT").
A comprovação do adimplemento das obrigações referidas no item 1 deste dispositivo será examinada, de forma individualizada, na fase de cumprimento da sentença, com auxílio de expertdesignado pelo Juízo, se o caso assim o reclamar.
Para a consecução dessas mesmas obrigações, e tendo presente i) a urgência de sua concretização para assegurar a higidez do meio ambiente de trabalho; ii) o que consta dos arts. 24 e 26, parágrafo único, inciso I, da Lei n. 8.666/93 (Lei de Regência das Licitações Públicas), assento que o caso configura hipótese de situação emergencial a justificar a contratação direta por dispensa de licitação.
Não comprovado nestes autos o cumprimento das obrigações de fazer, fixo, nos termos do § 4º do art. 461 do Código de Processo Civil, de aplicação supletiva, multa diária de R$ 10.000,00 (dez mil reais), com marco final no prazo sucessivo de 45 (quarenta e cinco) dias, após o que fica estabelecida a possibilidade de expedição de ordem de interdição judicialdo prédio-sede da SESAP/RN, de modo a garantir a eficácia das obrigações exequendas - que versam sobre segurança e saúde no meio ambiente de trabalho -, e a própria dignidade do Poder Judiciário.
O réu é isento de pagamento de custas (art. 790-A, inciso I, CLT).
Caso verificado o descumprimento das obrigações de fazer, para além do prazo máximo concedido, assento a possibilidade de majoração das astreintes ou a imposição de outra obrigação para a efetivação da tutela, na hipótese de se mostrar a já fixada insuficiente para seus escopos (cf. art. 461, § 6º, do Código de Processo Civil).
No tocante à multa consolidada pelo descumprimento da liminar e à eventual procedimento de cumprimento de sentença, relativamente às multas previstas, bem como em relação à indenização por danos morais coletivos, deverá ser observado, quando à destinação dos valores, o rito previsto no capítulo 2.4, supra.
Não há incidência de contribuições sociais ou imposto de renda sobre o montante da condenação, tendo em vista a natureza do objeto da condenação. Dê-se ciência à União Federal, nos termos da lei.
Após o trânsito em julgado, à Contadoria para a elaboração da atualização das multas para consequente expedição do Requisitório de Precatório.
Intimem-se as partes, na forma da lei.
Natal(RN), 15 de fevereiro de 2016.
LUCIANO ATHAYDE CHAVES
Juiz Titular da 2ª Vara do Trabalho de Natal/RN